(12-01-2025 às 19:58:28)
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Pendentes |
A palavra pendente, do latim pendente, é aplicada, no sentido literal do termo, enquanto adjectivo proveniente do verbo pender (pendere), qualificando objectos originalmente criados pela sua natureza formal e/ou decorativa, a estarem suspensos ou pendurados. Visite também, peças com mais valor, Avaliador Oficial e critérios de avaliação. Contacte-nos! Depois dos brincos é para o ornamento do peito e do pescoço que se voltaram os desejos. Assim o esclareceu Rocha Peixoto, referindo-se directamente aos fios de contas, cordões, cadeados e grilhões, de onde suspendem florões, "o symbolo da fé ou o symbolo do amor". "Accessorios pendentes", foi a expressão escolhida por este autor para apelidar genericamente estas peças, embora utilize igualmente as palavras berloque e pingentes. Luís Chaves preferiu designá-las de jóias móveis, referindo-se aos berloques, pingentes, pendentes e pendeloques (termo que retirou, sem tradução, do francês), e afirmou que as peças de ourivesaria têm no peito o principal valor do seu objectivo artístico e económico. Apesar da abundância de termos nomeados, nota-se uma predilecção por parte deste investigador, pela palavra pingentes, os quais dividiu em três categorias distintas: religiosos ou de sentimento religioso - medalhas, símbolos (cruzes, crucifixos), imagens; de aplicação mágica ou de fantasia - figas, peças de coral, etc.; amorosos ou de circunstância pessoal, como o coração e as medalhas com retratos e outras relíquias íntimas. O coração como simbolo do amor, e a cruz ou o crucifixo como simbolo da fé, constituem os temas populares mais preferidos, seguidos das imagens de Nossa Senhora da Conceição, relicários, medalhas religiosas e amuletos diversos em uso há vários séculos não só em Portugal como em toda a Europa.
Os pendentes são motivos "democratizados" comuns a todos os gostos, estabelecendo uma relação plena de harmonia e sintonia entre si, independentemente das raízes históricas e culturais de cada um. Compare-se, a título de exemplo, o retrato da Infanta Ana, de Espanha, da autoria de Pantoja de la Cruz (1602), um céu estrelado, assim metaforizado por D. António da Costa e encontrar-se-á grosso modo, a mesma confraternização de motivos: grandes cruzes, relíquias e imagens religiosas convivem lado a lado com corações, figas e corais, entre outros, com ascendências que se perdem na memória dos homens.
A diferenciá-los, apenas os materiais, técnicas e modelos de fabrico, cuja evolução cronológica e preferências espaciais não são fáceis de estabelecer, devido à diminuta informação documental e iconográfica existente. Documentos como inventários, dotes, testamentos, vendas e contratos para a execução de uma obra, podem fornecer dados quanto aos nomes, materiais e mesmo técnicas utilizados em determinados objectos, mas são praticamente omissos no que respeita aos desenhos ou formas que os moldam. Através da análise dos bens testamentários do Cartório de Gondomar (1834-1893) pode-se constatar que os corações e as cruzes são as peças que mais aparecem adicionadas aos cordões, seguidos pelas Senhoras da Conceição, breves e, apenas num caso, uma borboleta. Informações preciosas, sem dúvida, que comprovam a popularidade destas peças e revelam a sua importância económica. No entanto, em quase setenta anos de testamentos das freguesias mais povoadas do Concelho de Gondomar, apenas uma vez se esclarece ser um coração de filigrana e duas cruzes serem igualmente designadas como estrelas, forma que corresponde à cruz de Malta, também em filigrana. O tema engloba a maior parte dos pendentes referidos, como os corações, cruzes, Senhoras da Conceição e amuletos vários, passíveis de serem produzidos em chapa moldada sobre cunho. Por essa razão, excluem-se do conjunto dos moldes as medalhas, relicários e demais peças afectas a outras técnicas de fabrico, nomeadamente em fio (simples ou filigranado), canovão e fusão, que obrigam a processos próprios de execução. A popularidade e preferências sentidas para com os corações e cruzes imediatizados pelas Senhoras da Conceição, manifestam-se também neste micro universo de gostos e formas. Eles destacam-se, claramente, pelo número, diversidade de tamanhos, motivos decorativos e sobretudo pelo estado gasto dos cunhos, testemunho evidente da passagem do tempo e do uso intenso a que continuam sujeitos. Cada modelo será, no entanto, tratado por ordem alfabética, independentemente das unidades, dimensões e riqueza ornamental de cada um. Âncoras Os moldes apresentam uma âncora inscrita com tamanhos reduzidos que variam entre um, um e meio e dois centímetros, para cada um dos casos. Tratam-se de objectos simples, sem ornamentos e que reproduzem fielmente a estrutura de uma âncora; esquema cruciforme, com uma linha vertical ao centro, outra horizontal em cima, formando os braços da cruz, e inferiormente uma outra em forma de crescente, com as extremidades realçadas por motivos triangulares. Os braços da cruz são animados, por pequenas linhas verticais, dois em cada lado, escavados na figura. A pequena dimensão das três âncoras, bem como a simplicidade decorativa nelas patente, sugerem que estes pendentes empregar-se-iam preferencialmente no pescoço, pulso ou suspensos nas fraldas, isolados ou em conjunto com outros amuletos. Chave Os seus tamanhos são reduzidos, um a dois e meio centímetros de comprimento. A figura seguinte ostenta os três elementos que compõem normalmente uma chave: empunhadura, cano e palhetão. O cano é cilíndrico e liso com dois cortes a três quartos de altura, o palhetão quadrangular disposto no canto inferior direito e a empunhadura descreve um oito deitado, contendo na parte superior e ao centro, uma pequena esfera. Note-se que esta chave foi trabalhada numa pequena chapa de metal e posteriormente colocada sobre uma matriz de bronze. A ser assim, a chapa que a recobre pode ser mais recente. O mesmo acontece com outros cunhos; o desgaste constante a que estes objectos são sujeitos, explica os danos causados nos modelos neles reproduzidos e o reaproveitamento do bronze que sobra para suporte de outras formas. A chave da figura seguinte foi trabalhada directamente no cunho, sendo constituída por uma empunhadura ovalada e um cano comprido, idêntico ao da figura anteriror, notando-se, contudo, a ausência do palhetão. Tal como a generalidade dos amuletos, a chave podia ser fabricada em ouro, prata, ferro, aço, madeira, osso, entre outros materiais. Era usada por adultos e crianças, pendente por um fio ao pescoço, pulsos, cinto ou presa nas fraldas. Um exemplar existente no MAPL, produzido em metal dourado e datado de cerca de 1940, revela outras utilizações, nomeadamente alfinetes de usar ao peito ou atavios de chapéu. Infelizmente não apresenta qualquer contraste ou marca de fabrico Corações O coração constitui um dos ornamentos mais frequentes no mundo artístico, empregue em todos os tempos e lugares, trabalhado de forma isenta ou servindo de elemento decorativo noutros objectos. Na ourivesaria encontramo-lo fabricado em materiais diversos, dos mais modestos aos mais exuberantes, desde metais sem valor económico, à prata, ouro, platina, com incrustações simples de pedras preciosas ou formando um só corpo de águas marinhas, topázios, diamantes e muitos outros, verdadeiros reflectores de luz no peito, orelhas e demais partes do corpo. Em termos técnicos, podem ser modelados em chapa, filigrana, fabricados por fusão ou lapidados.Os corações mais vulgares e procurados, no contexto da ourivesaria popular, são, sem dúvida, os de chapa muito fina e os de filigrana, conhecendo várias denominações em função dos processos de execução e do desenho que apresentam: corações de chapa ou laminados, simples ou em chama, corações opados, de face dupla, que, quando evidenciam uma chama, em vez de corações flamejantes (consoante os denominam comercialmente) se designam por "corações coroados ", pois tomam por coroa a língua de fogo. Os opados, tal como se depreende do nome, são ocos e formados por duas faces mais ou menos bojudas, soldadas nas extremidades, por vezes ligadas por uma tira do mesmo metal dobrada e soldada a todo o perímetro da peça", decoradas exteriormente com finos fios de filigrana ou um granulado, com motivos de amor, florais ou religiosos ou lavradas moldadas sobre matriz. Segundo informação de Amadeu Costa, os corações flamejantes podiam igualmente ser chamados duplos por se confundir a estilização das chamas com um outro coração, acrescentando ainda, serem estes os mais usados pela vianesa.Os corações existentes na colecção correspondem, pela técnica inerente ao trabalho de chapa de metal sobre cunhos, ao grupo dos opados e flamejantes, duplos, ocos e lavrados, também conhecidos como estampados e barrocos. Pelas dimensões que apresentam (variando entre três e doze centímetros) destinam-se sobretudo ao fabrico de ornamentos de peito. Apenas um ou outro cunho serve de suporte a um modelo liso, cujas medidas reduzidas (cerca de um centímetro) indiciam um emprego como berloque de pulseiras, cadeias de relógio ou fios de pescoço infantis, independentes ou agrupados a outros motivos.
Os corações são compostos por duas partes bem demarcadas: a inferior e maior, formando o elemento cordiforme propriamente dito, e uma superior a esta que representa a estilização do órgão chamejante, emergindo as chamas directamente do corpo central ou separando-se deste por intermédio de um anel liso. A parte inferior é envolvida, em todos os casos, por uma linha lisa tratada, nalguns casos, com grande cuidado (as extremidades superiores apresentam, por vezes, um ligeiro enrolamento) que marca os limites extremos da peça e impede o remate abrupto dos ornamentos sobre as paredes laterais do objecto. O vértice do coração pende variavelmente para a esquerda ou direita, com acentuação mais ou menos perceptível.Em termos decorativos e em função do modo como os ornamentos se distribuem pelas faces cordiformes, é possível separar duas categorias de corações opados e flamejantes: os que apresentam uma carteia de contorno igualmente cordiforme, rodeada por um friso pleno de motivos vegetalistas e aqueles cuja superfície da peça é toda invadida por uma densa e farta vegetação, traçada ou relevada com um cuidado e precisão variáveis e colocados de forma simétrica ou assimétrica dentro do conjunto. Os motivos decorativos, retirados essencialmente do reino vegetal são, contudo, comuns a ambos os tipos e repetem, na sua maioria, aqueles observados para os brincos: flores em botão, em cálice ou desabrochadas, de quatro a sete pétalas, com ou sem caule, algumas de recorte e desenho solto; outras mais naturalistas, próximas de girassóis e rosas, folhas trifoliadas, polilobadas ou reproduzindo fielmente uma parra, unidas por ramos finos, motivos enrolados de contornos vários, outros em espiga, pequenos cachos com três bagos e palmetas de extremidades enroladoas, com características híbridas que questionam a sua inserção no grupo dos elementos geométricos ou fitomórficos. Os ornamentos geométricos são praticamente omissos, mantendo-se apenas a meia esfera, aqui totalmente subordinada ao centro das flores. Dos restantes, salienta-se a presença de uma mão, em posição invertida, que segura um ramo, uma taça de onde brotam flores e folhas e pequenos corações lisos, expostos no centro do motivo principal, rodeados por outros desenhados linearmente. O remate superior, de contorno arredondado (nalguns casos também delimitado por uma linha), compõe-se frequentemente por uma série de linhas paralelas, direitas ou sinuosas, livres ou sufocadas ao centro por um anel liso, em crescente e decrescente, representando as chamas mais ou menos estilizados dos corações ardentes. Nos exemplares maiores e mais profusamente decorados, os remates terminam com uma flor ou meia flor ao centro e em cima, ladeadas por folhas compridas pousadas sobre as chamas, envolvendo lateralmente todo o corpo da coroa. A divisão dos corações estampados em dois tipos - os de carteia cordiforme lisa, ao centro, e os ornamentados na totalidade da face - funciona apenas no contexto específico da colecção da ourivesaria popular, feita por uma razão meramente metodológica, fruto da necessidade de ordenar tipologicamente todos os cunhos. Em termos práticos (e não esquecendo que se tratam de peças ocas constituídas por duas faces), as diferenças decorativas, sentidas nos dois modelos eram aproveitadas e não rejeitadas nas oficinas. Tal significa que, embora por vezes fossem utilizadas duas partes iguais para criar um mesmo coração, na maior parte dos casos a chapa de metal era trabalhada em matrizes diferentes, mecanismo técnico que permitia enriquecer ornamentalmente estas peças. O objecto assim fabricado seria preferencialmente escolhido no acto da compra, por apresentar duas opções de uso e permitir à sua proprietária jogar com esse atributo.Os dez corações flamejantes existentes no MAPL são afins em termos técnicos e ornamentais a estes, possuindo faces distintas, de acordo com os dois modelos observados: de uma das faces é profusamente decorado com motivos de volutas, flores e folhas centradas por ornato concheado relevados e cinzelados. Na face oposta é ornamentado ao centro por carteira lisa em forma de coração com seta, emoldurada por motivos em SS, folhas e flores igualmente relevadas, descrição de um dos corações que serve de modelo para todos os outros existentes. A descrição concisa a que foram sujeitos os dois corações opados existentes no Museu Nacional do Traje não nos permite saber se as duas partes são iguais ou diferentes. A mesma solução técnica pode ser observada no coração opado flamejante, barroco, fotografado no tão citado livro Ouro popular português, onde se manifesta toda a riqueza de elementos que cobrem parte ou a totalidade das faces componentes do coração.A cronologia mais antiga que se conhece para estes corações ronda o terceiro quartel do século XIX; os dois corações de ouro, em chapa estampada com chama, que estiveram expostos na 1" Exposição de Ourivesaria Artesanal de Gondomar, apresentavam Marca do Porto, usada entre 1865-1880. Da mesma altura, deve datar o retrato de uma jovem de Guimarães que ostenta ao peito um coração flamejante com carteia cordiforme lisa, suspenso num cordão. Estas são as únicas datas aproximadas que se conhecem para os pendentes cordiformes.Os dez corações já referidos, presentes no MAPL, terão dado entrada no museu em 1948 tratando-se, portanto, de uma aquisição relativamente recente. Nenhum deles apresenta marcas incisas, o que impossibilita o conhecimento quer da proveniência quer do nome do ou dos ourives que os trabalharam. O facto de terem chegado juntos ao Museu, de terem sido todos fabricados em metal dourado (com uma valorização económica inferior), de apresentarem as mesmas soluções técnicas e uma grande uniformidade nos motivos decorativos escolhidos, parece indiciar, contudo, que se tratam de objectos oriundos da mesma oficina, fruto de um encomenda que não tinha o objectivo da valorização económica das peças mas a sua representatividade tipológica no conjunto de peças respeitantes à ourivesaria popular. Os dois corações do MNT, também de metal ou latão, não acrescentam nada de novo em relação aos anteriores. Um deles não apresenta quaisquer marcas de contraste ou de ourives e o outro apresenta uma marca na argola do coração, mas ilegível, pelo que se desconhece também a origem das oficinas que os produziram bem como as datas em que foram executados. O mesmo acontece com o coração fotografado no livro Ouro Popular Português o qual, tal como acontece com todos os outros objectos incluídos nesta obra, carece de qualquer informação concreta que não seja a sua simples inclusão no contexto e as fotografias, de grande qualidade e precisão. Sobre todas elas, apenas nos é dado saber que pertencem a colecções particulares e na quase totalidade do século passado e princípio deste. Se os corações duplos ou opados eram os preferidos da mulher de Viana, facto que parece comprovado no peito focado de uma Mordoma da Meadela, o seu uso seria certamente generalizado no litoral e muito comuns no Douro. Concretamente, observamo-lo no peito de uma mulher vestida com o Antigo trajo do Minho, no de uma jovem de Guimarães, e numa outra de Pombal, retratada por Platão Mendes, curiosamente todos obedecendo às mesmas características ornamentais: lisos ao centro, com festão fítomórflco em volta, suspensos num fio de contas no primeiro exemplo, num cordão nos restantes. Crescente A decoração do crescente reduz-se à alternância de espaços côncavos e convexos, num movimento ritmado que proporciona uma concepção ornamental simples mas eficaz em termos estéticos. Não é possível comparar, no entanto, a sobriedade deste modelo com a riqueza decorativa de muitos outros espalhados pelo país, dos quais se destaca a representação antropomórfica da meia-lua. Eram fabricados preferencialmente em prata e cobre, aproveitando-se muitas vezes para o efeito moedas desses metais e eventualmente em ouro, embora não se tenha recolhido nenhuma informação nesse sentido.O tamanho reduzido deste crescente aponta para a sua associação com outros amuletos, presos em cueiros de bébés ou suspensos, por fios de natureza diversa, ao pescoço de crianças e adultos. Cruz A cruz é, enquanto instrumento da fé, um dos motivos mais difundidos e vulgarizados em todas as artes decorativas, eternamente associada à Paixão e Morte de Cristo e ao mesmo tempo símbolo da Salvação. No caso específico da ourivesaria popular, esta realidade justifica a diversidade de tipos existentes e a competitividade que a cruz estabelece com o coração, ambos pleiteando o lugar de honra no peito da mulher nortenha. Mas, se as formas de cruzes são várias, a cruz de Malta parece ter ocupado, nas mesmas regiões, o topo hierárquico das preferências; a Cruz de Malta rivaliza com o Coração. Os braços bi-ponteagudos da Cruz, limitam a fantasia do artista, que se expande no enchimento, nas rosáceas abertas, de pétalas de renda de ouro, nos esmaltes, segundo palavras de Luiz Chaves, descrição que se enquadra no habitual estilo linguístico expressivo e emotivo deste autor. À simbólica inerente ao objecto liga-se a necessidade de luxo e ostentação, patentes num barroquismo decorativo que chega a encobrir o traço original do tema pretendido. Assim se explica que a cruz de Malta seja apelidada igualmente de "estrela",confusão ligada à forma dos seus braços bi-ponteagudos, designação que se encontrou, até ao momento, documentado desde o último quartel do século XIX. A predilecção assumida pela mulher nortenha pela "estrela" pode ser observada em diversos retratos onde convivem, no mesmo peito, uma ou duas "estrelas", juntamente com outras cruzes que obedecem a técnicas e formas diversas. Nestas circunstâncias, a cruz de Malta parece ganhar em decoração o que perde em simbologia, realidade compensada com a presença de outras cruzes, nas quais a função mística é mais evidente. A importância da cruz, enquanto motivo decorativo e simbólico, explica a abrangência deste adorno e a generalização do seu uso entre homens, mulheres e crianças, razões que justificam, também, a diversidade de materiais, técnicas e formas do seu fabrico: prata, ouro, platina, pedras preciosas ou semi preciosas, entre os elementos mais usuais, chapa, fio, fusão ou lapidação, técnicas que repetem as anotadas para os corações, formas simples ou ricamente decoradas em função dos gostos e destinos. Na ourivesaria popular, os termos utilizados são variados, relacionando-se não só com os processos de fabrico mas, igualmente, com as soluções decorativas e formais que apresentam: a Cruz de Malta, já referida, em filigrana e eventualmente colorida com esmaltes, os crucifixos maciços, fundidos, cinzelados, com resplendor da mesma técnica e não filigranado. Os nomes pelos quais são vulgarmente conhecidas:cruz latina estampada de braços rectangulares e cruz latina estampada trifacetada. Em termos técnicos podem ser de uma só face, com uma face e forro liso atrás, e duplas ou contramoldadas, quando apresentam duas partes iguais, soldadas no ponto de junção. "Cruz de Sacramento" Vários cunhos da colecção suportam este modelo de cruz, representado em vários tamanhos. Em termos morfológicos trata-se de uma cruz latina com as extremidades dos braços trilobados. A sua sobriedade, tal como a descreveu Amadeu Costa, recai na singeleza da decoração, reduzida à sucessão de espaços lisos com frisos estriados, inscritos no centro, nuns casos, no centro e envolvendo exteriormente a peça, noutros. O interior da cruz é, por vezes, revestido com esmaltes coloridos (azul, vermelho, verde...) e, nalguns casos, recebe a incrustação do Senhor Crucificado. A identificação desta cruz com a designação cruz de sacramento foi retirada de uma obra de Pedro Fazenda, onde se observa a reprodução de uma cruz de ouro polido e estampada, com o canelado corado, acompanhada da respectiva legenda. Trata-se de uma peça pertencente à "Casa António Ribeiro Coelho", do Porto, que, segundo informação do autor, efectuava vendas por junto, com grande expansão em todo o país. Luis Chaves, também se refere às Cruzes de Sacramento, de ouro polido e estampado, agrupando-as entre os pendentes de peito mais populares, juntamente com os grandes corações guarnecidos de filigrana, as Cruzes de Malta, os Crucifixos de canovão com filigranas (...), os relicários e as imagens de Nossa Senhora da Conceição.
Amadeu Costa, ao inventariar várias tipologias de cruzes, utiliza o mesmo termo cruz do Sacramento, que interpreta como sendo muito sóbria. Nenhum dos autores esclarece, contudo, a origem e o porquê do nome atribuído a esta cruz, muito procurada e ainda hoje fabricadas em oficinas de Gondomar. Num trabalho relativo ao traje regional de Barcelos surge linearmente reproduzidas uma série de peças de ourivesaria supostamente típicas da região, como "borboletas" de chapa, cruz de Malta e argola de filigrana, entre as quais se inclui uma cruz trilobada suspensa dum cordão, facto que parece comprovar da sua popularidade no Minho.
Cruz latina estampada, de braços rectangulares Em termos formais, estas cruzes apresentam uma feição rectangular nas extremidades dos braços e das hastes. Divergências decorativas permitem, no entanto, separar dois tipos de cruzes: o primeiro, bastante simples, é constituído na parte central por uma cruz lisa, sendo cada unidade compósita escavada ao centro, criando no final uma outra cruz mais singela. Esta solução técnica do molde proporciona uma maior liberdade no acabamento da obra; a alternância de espaços côncavos e convexos enriquecem a peça, quando não se opta por preencher a parte escavada com esmalte ou mesmo pedraria, enobrecendo-a, assim, em matéria e colorido. Um friso estriado envolve exteriormente o motivo, solução de remate que permite uma maior valorização ornamental do conjunto. Manuel Rosas faz referência a um tipo de cruzes estampadas em chapa de ouro fino, lisas só com os vincos, que designa de requife. Os elementos parcos que fornece, bem como a ausência de acompanhamento de imagem, impedem de saber, com certeza, se o autor pensava nesta cruz quando escreveu o texto e se os ditos "vincos" correspondem às partes escavadas ou estriadas que indicámos. O segundo tipo, representado apenas numa matriz da colecção, é decorado com frisos lisos e rugosos que se intercalam, crescendo em espiral ao longo do corpo - para a esquerda na haste, para a direita nos braços -, promovendo direcções opostas de linhas, agradáveis ao olhar. O ponto de intercepção dos dois braços é ocupado por uma flor de oito pétalas que parece recriar um malmequer. Cruz latina estampada, trifacetada Molde único no conjunto, esta cruz delgada, mas de grande efeito estético, mostra dimensões muito reduzidas que não ultrapassam os dois centrímetros. A zona superior da haste e os braços são diminutos, evidenciando-se melhor a sua forma na parte inferior da haste, composta por três faces que vão estreitando para o centro. É este o aspeto da obra acbada, quando trabalhada numa só face. Quando dupla, a cruz obedece a um esquema hexagonal com seis lados demarcados. Desconhece-se, contudo, o processo de tratamento, decerto variável em função dos gostos e meios-uma pequena cruz de Malta sobre o "cruzeiro e quatro meias esferas, uma em cada extremidade dos braços, completam a ornamentação deste cunho. "Cruz oca e barroca" As cruzes "barrocas", termo inspirado na riqueza decorativa que as cobre, são as mais abundantes no contexto da colecção aproximando-se, em termos técnicos e ornamentais, do grupo dos corações, arrecadas e brincos compridos, denunciando, uma vez mais, a riqueza destes cunhos no âmbito do estudo das peças estampadas e opadas. Formalmente inscrevem-se entre as cruzes latinas e tecnicamente nas de chapa fina estampada de duas faces soldadas no ponto de junção, processo que explica o sobrenome de ocas, opadas ou contramoldadas. A sua peculiaridade reside, no entanto, na profusão de motivos ornamentais que as preenchem e ditam o contorno dos seus braços: ovais, triangulares, rectangulares de extremidades afuniladas. Nas cruzes maiores, a parte inferior da haste é mais larga do que as restantes, proporcionando o desenvolvimento das composições decorativas mais elaboradas.A distribuição dos motivos ornamentais pelo corpo da cruz é bastante variada, exigindo, por isso, uma análise atenta e cuidada. Genericamente, encontrámos disposições decorativas de ordem simétrica, de simetria parcial (designação adoptada nos momentos em que a simetria é rejeitada apenas num motivo ou num ponto de cada parte) ou assimétrica, podendo-se encontrar no mesmo objecto as três possibilidades. De modo a simplificar o seu tratamento, as cruzes foram apresentadas em duas formas distintas: Traçando uma linha imaginária a meio das hastes e braços das cruzes, nota-se uma variedade enorme de soluções na distribuição dos elementos decorativos, bem como no domínio do desenho e respectiva adaptação ao espaço disposto pelo autor do traço, factores que justificam plenamente a riqueza ornamental destes objectos. A análise deste quadro permite detectar nove situações possíveis no que toca às disposições ornamentais.
A primeira é a mais frequente nas cruzes pequenas, mais sóbrias, relacionando-se normalmente com o esquema 1). Casos de simetria parcial observam-se nos esquemas c/d, b/c e e/f das posições 4), 5) e 9) respectivamente, normalmente exemplares únicos, em que a alternância só se faz numa parte, sendo a restante simétrica. A assimetria (presente na situação 8), deve-se ao contorno do motivo decorativo principal, a cesta, que pela sua natureza tem uma só colocação possível. O esquema 9) reproduz a cruz (única) que apresenta maiores dimensões e uma maior elaboração em termos decorativos, com uma variedade de soluções ornamentais superior a todas as restantes.
Algumas destas peças apresentam, ao centro e em relevo, cruzes mais pequenas, lisas, lineares, estriadas ou perladas que parecem chamar a atenção para o motivo original do pendente, oculto, num primeiro olhar, entre a grande profusão de ornamentos. O centro ou "cruzeiro", ponto de intercepção da cruz, é ocupado por elementos variados, com destaque para os diminutos corações lisos, com chama e vértice direccionado para a esquerda, direita ou centrado, para as flores de recortes diversificados, em botão ou desabrochadas com cinco, seis, sete ou oito pétalas, isoladas ou duplas, independentes ou saídas de cornucopias delgadas, distintamente posicionadas, flor de Hz e motivos vegetalistas estilizados ou híbridos, numa solução que caminha entre uma raiz foliácea e floral. Uma destas cruzes possui ao centro um orifício oval, ligeiramente escavado, destinado à lapidação. As composições são raras. Exceptuando-se o caso da mão que segura uma cruz estriada, de uma outra a envolver anéis fítomórficos e das cestas ou cornucopias que libertam flores e folhas, todos os restantes elementos decorativos são dispostos isoladamente, ocupando o seu espaço vital próprio, sem qualquer relação aparente com os outros que se lhes avizinham.Quanto aos motivos de foro geométrico, salientam-se as esferas, linhas rectilíneas, perlados e S, delimitando estes últimos as estruturas dos braços. Os elementos vegetalistas são os mais variados e os mais representativos destes objectos. Ramos enrolados nas extremidades, linhas serpentiformes sobrepondo-se a outras e torçais terminados em flores, relacionam-se directa ou indirectamente com folhas e flores de contorno mais ou menos estilizado. Trifólios ou folhas de limbo diversamente recortado, com ou sem nervura central, inscrevem-se no grupo dos folheados. As flores, em botão, cálice ou abertas de quatro a oito pétalas, de extremidades arredondadas ou espetadas, cuidadosamente separadas entre si, com ou sem caule, isoladas ou ligadas pelo mesmo caule a outros motivos, numa linguagem fantasiosa ou obedecendo a premissas mais naturalistas (como se observa nos "narcisos" vistos de perfil), assumem um lugar privilegiado na ornamentação das cruzes. Os restantes motivos figurativos não são muito abundantes. Para além dos corações e mãos, já apontados, nomeiam-se as conchas colocadas nas extremidades dos braços e separadas do conjunto através de palmetas e as cestas executadas com grande rigor de desenho. Neste ponto, estamos afastados da grande variedade de ornamentos patentes nas arrecadas e nos brincos compridos, de origem tantas vezes simbólica. Os pendentes, tomando já por si o corpo de um símbolo, parecem dispensar a presença de outros signos, realidade que parece justificar a maior incidência de motivos fitomórficos nas cruzes e nos corações.Nos remates das cruzes, a esfera ocupa, mais uma vez, um lugar privilegiado. Actua como um motivo independente, sendo colocada nas quatro extremidades da cruz ou apenas em duas (braços ou hastes), funcionando como a chave do conjunto, ou está subordinada a outros motivos, firmando corpo com eles: fecho de botões florais, entre pétalas de flores, sobre linhas onduladas (de extremidades enroladas, afrontadas ao centro), encimando motivos folheados, palmetas invertidas, conchas, flores diversas e motivos em S, que envolvem a estrutura da cruz. São utilizadas ainda para preencher espaços deixados em aberto, tipo rosetas, proporcionando recortes mais delicados da cruz. Trifólios, motivos fitomórficos enrolados nas extremidades e um outro formado por meia coroa de pétalas e folha ao centro, constituem, pelas suas características morfológicas, os únicos elementos de remate que parecem dispensar a utilização da esfera. Em termos técnicos, formais e ornamentais, o conjunto destas matrizes parece ser bastante representativo no contexto dos modelos de cruzes opadas fabricados em Portugal. O Museu de Artes Populares de Lisboa, o Museu da Sé de Braga, o Museu dos Biscainhos e o Museu Nacional do Traje, possuem várias cruzes "barrocas", de duas faces iguais ou diferentes, estampadas e soldadas nos bordos de junção, com extremidades apontadas ou arredondadas e que repetem em relevo os mesmos motivos encontrados nos cunhos das cruzes ou de outros modelos da colecção: perlados, palmetas, corações, setas, coroas, cruzes lisas mais pequenas ao centro, no ponto de cruzamento dos braços, cestas com flores e motivos fitomórficos variados. A ausência de marcas gravadas numas peças, a ilegibilidade de algumas ou dificuldade de identificação de outras, não nos permite conhecer as oficinas e ourives onde foram trabalhadas, bem como o local de origem. A proximidade da marca presente numa das cruzes do Museu dos Biscainhos, registada em 1865 (Porto), parece constituir a única excepção no âmbito deste contexto. O seu autor é, no entanto, também ele desconhecido. As descrições dos objectos patentes no Catálogo da Ia Exposição Artesanal de Gondomar, de 1973, usualmente úteis em termos de datação e origem das peças, revelam-se, no tocante às cruzes, pouco profícuas; estas são designadas genericamente de Cruz em chapa estampada ou Cruz estampada dos dois lados, pelo que ignoramos da inclusão ou não das cruzes"barrocas" neste grupo. A análise de fotografias é mais enriquecedora no domínio cronológico, na medida em que, numa perspectiva diacrónica, nos revelam o uso destas cruzes através de um percurso que percorre os finais de Oitocentos até aos Anos Cinquenta do nosso século, seguindo uma tradição e constância que chegou aos nossos dias. O seu enquadramento no quadro dos costumes portugueses permite-nos, ainda, avaliar da distribuição do seu uso no nosso país. A fotografia mais antiga do grupo, datada de 1894, retrata uma mulher de Arouca ao lado de outros indivíduos da região que ostenta ao peito, entre uma grande profusão de fios e pendentes difíceis de identificar, duas cruzes ocas e barrocas, uma em destaque de grandes dimensões e outra em cima, junto ao pescoço, consideravelmente mais pequena. Do início do século, conhecemos vários exemplares que revelam o seu uso em regiões distintas: em Braga,com as Lavradeiras (dos arredores de Braga), grupo de três mulheres, usando duas delas uma cruz "contramoldada, nas três raparigas de S. Julião do Freixo, usando a da direita uma cruz ao peito de proporções consideráveis e em Arouca, num grupo de mulheres retratadas em conjunto, (fotografia datada de 1908]), onde a quarta (a contar da esquerda para a direita), de nome Maria Ambrosina Ribeiro, usa uma cruz opada. Para os Anos Vinte, encontrámos a mesma tendência documentada em Arouca, aproximadamente de 1925, num grupo de cinco mulheres fotografadas com traje regional, usando duas delas, entre outros objectos de ourivesaria, uma cruz estampada.Da Madeira chega-nos idêntica tradição num postal ilustrado de 1928, que retrata uma mulher da ilha adornada com vários cordões e fios ao peito, pendendo, de um deles, uma cruz oca e barroca de reduzidas dimensões. Ligeiramente mais tardia, deve ser a fotografia da Rapariga de Montalegre com cruzes de ouro, pendentes de cordões ao pescoço, entre as quais se distingue duas cruzes contramoldadas, suspensas num fio de contas. De 1948 surge-nos, num trabalho de Conde d'Aurora, um desenho representando uma Vianense preparada para as Festas da Agonia e numa fotografia de 1953, é possível observar o mesmo uso na Póvoa de Varzim, num grupo de mulheres com Traje de Romaria e festas. FIGA Chama-se figa a um gesto mágico que se obtém com a mão fechada de maneira que o dedo polegar sobressaia d'entre o indicador e o médio e que actua como preservativo contra feitiços, quebrando o mau olhado. A facilidade do gesto acompanhada pela respectiva materialização em diversos materiais, conferiram-lhe um lugar privilegiado no conjunto dos amuletos portugueses, dos quais surge como o mais típico, usado e generalizado pelo país e além fronteiras. A abundância com que aparecem na colecção, superior a qualquer dos outros amuletos nela existentes, reporta-nos igualmente para a sua popularidade. As figas são representadas em verso e reverso (cinco vezes no mesmo cunho, uma vez em matrizes separadas), enquadrando-se, assim, em termos técnicos, no grupo das peças ocas, estampadas em cunhos de bronze. Leite de Vasconcelos faz referência a esta técnica no seu texto "A Figa", informando que as peças ocas eram estampadas em cunhos de aço, ferro e bronze, distinguindo-as assim das maciças, que eram fundidas segundo os processos normais de fundição (areia, gesso, siba ou osso de choco, também chamado pelos ourives "casca"), e depois cinzeladas (...) juntamente com um outro processo especial de fundição, que se denominavam de "ceras perdidas", pelo qual se formava logo uma figa acabada e artística, sem intervenção do cinzé". A informação é ainda acrescida de dados rigorosos relativos aos locais onde eram produzidas e à forma como funcionava a transacção das mesmas:" as figas de ouro e prata provinham de indústrias caseiras que se exerciam em Gondomar, Avintes, e outras terras vizinhas do Porto (...) e entravam no mercado por intermédio de corretores que as tomavam em Gondomar etc, á consignação, e as dispersavam por todo o Portugal; quando não conseguiam vendê-las todas, entregavam as restantes aos fabricadores(...)", indicações estas tanto mais valorizadas quanto alargadas a outras peças de cariz popular. A forma de venda enquadra-se, aliás, na tradição da circulação destes objectos por mercados e feiras, com a consequente dispersão dos mesmos por todo o país, espalhando-os as ourivesarias do Porto sobretudo para o Norte e para as Beiras: e nisso está outro motivo de não morrer a superstição. Pelo que fica dito, os cunhos analisados, hoje pertencentes a uma oficina de Gondomar, outrora a uma outra do Porto, enquadram-se, enquanto realidade física e espacial, no ambiente descrito por Leite de Vasconcelos. Embora hoje não sejam praticamente produzidas na oficina Fernando Martins Pereira, as figas seriam igualmente fabricadas em ouro e prata e, eventualmente, em cobre ou numa liga de metais menos nobres, de preço mais acessível. As figas de ouro são, para Leite de Vasconcelos, apreciadas pelo seu valor material, incluindo o ouro no grupo dos materiais indiferentes, ou seja, sem qualquer conteúdo mágico. A essa valorização económica não podemos negligenciar, contudo, um profundo sentido afectivo e mesmo místico que observamos no emprego deste metal pelo que, reduzir a procura das figas de ouro a um mero sentido mercantilista parece-nos simplificar demasiado o problema. Assim, e para a primeira quadra, entenda-se que para alguém especial e já escolhido, especifica-se a pretensão da oferta, não de uma figa qualquer mas de ouro, enquanto que na segunda, realça-se o contraste de um chapéu sem qualquer valor económico com a presença de figas, agora no plural, também de ouro. Nos dois casos, embora no primeiro seja mais evidente, sente-se uma presença feminina forte e as figas parecem ser fruto preferencial de dádivas amorosas. Para além do ouro e também da prata, as figas eram produzidas em azeviche, âmbar, coral (por vezes com ouro) corno ou chavelho, ferro, sobejamente conhecidos pelo seu carácter apotropaico, em barro, com destaque para as de Estremoz, porcelana, coquilho, louça, madre-pérola, marfim, mármore, osso, vidro ou cristal, galalite, ceiulóide e até de massa preta ou vermelha, de forma a imitar o azeviche e coral. Em termos tipológicos e ao contrário do que acontece noutros exemplares que incluem também o antebraço, apenas a mão é representada nos cunhos da colecção. Os tamanhos são vários mas reduzidos, mediando entre um e meio a dois centímetros e meio de altura. Em quatro deles, o gesto é feito com a mão direita e em dois com a esquerda, o que prova que a escolha das mãos não estava definida, embora a diferença de números faça pender, aqui, a balança para a primeira. Desta variedade de posições, corrente de informações recolhidas oralmente em Lisboa, se deva fazer com a esquerda, por esta ter mais virtude e mais acção ou mesmo com as duas, que em Melgaço se prefira a direita por ter mais força, embora com as duas seja melhor e em Guimarães se faça com as duas mas cruzando os braços. Contrariamente ao observado nos cunhos da colecção, o mesmo autor acrescenta ter ouvido de vários ourives que o público procura e prefere, (...) as esquerdas e que as da mão direita, somente por encomenda se fabricavam. Elementos de foro decorativo, submetidos ao nível do punho, permitem-nos separar seis tipos distintos de figas: uma completamente lisa, duas com sulcos verticais (mais afastados num caso, formando gomos, mais estreitas e ténues no outro, uma com frisos horizontais terminando em meia esfera e duas com ornamentos vegetalistas que se enquadram nos mesmos tipos de flores, folhas e ramos fitomórficos observados para outras peças da colecção . Exceptuando o exemplo da figa lisa, em que punho e mão são tratados como um todo, sem interrupção, todos os outros têm inscrito um anel circular que separa essas duas partes do corpo. Peixe O peixe surge uma única vez representado e como motivo isolado, nos moldes da colecção. O animal foi trabalhado duas vezes no mesmo cunho em direcções opostas, posições que revelam o verso e reverso da imagem. Trata-se, portanto, de uma peça oca trabalhada nas duas faces, correspondendo em termos técnicos aos corações e cruzes já analisados. De tamanho reduzido (não chegando a atingir dois centímetros e meio de comprimento), as suas linhas apresentam uma grande preocupação de pormenor e mestria técnica patente na aplicação do desenho ao metal: a cabeça, cauda e barbatanas estão bem demarcadas e a boca, olhos e guelras são cuidadosamente assinalados através de finas incisões. Os pequenos pontos sobre o corpo relembram escamas, proporcionando um importante contributo para a riqueza decorativa e estética do conjunto. A presença do peixe, neste conjunto de moldes reveste-se de grande importância para o estudo dos amuletos portugueses produzidos e usados no país. Dos trabalhos relativamente abundantes relacionados com esta temática etnográfica, apenas três vezes o peixe foi enquadrado no grupo de amuletos. Mas as mais precisas são as referências que do peixe fazem Luís da Silva Ribeiro e A. Pires Thomaz, anotando o primeiro tratar-se de um amuleto infantil, mas raro na Terceira, onde o usam de metal. Existe em Vila Franca do Campo e o segundo de um amuleto infantil contra o mau-olhado, fabricado em prata, mas que o autor não encontrou vestígios do seu uso no concelho de Elvas. A sua presença na colecção indica a execução e emprego deste amuleto no Norte do país. Nossa Senhora da Conceição Imagem frequente na pendurada dos cordões, por vezes de apreciável peso (...), é a Senhora da Conceição, mãos no peito, olhos ao céu, pés sobre o crescente lunar. As Virgens da Conceição, designação preferida por Rocha Peixoto, também conhecidas como "Senhoras do Caneco ", dada a semelhança da coroa com o caneco de ir à fonte, incluem-se, assim, juntamente com os corações, cruzes, crucifixos e medalhões, no grupo dos pendentes mais populares e preferidos da mulher portuguesa. Manuel Rosas enquadra-as nas jóias de carácter popular, em chapa de ouro fino, que atingiram maior variedade e importância na segunda metade de Oitocentos e na primeira do século XX. As referências documentais encontradas, em fontes manuscritas ou impressas, juntamente com os exemplares que conhecemos destas peças, de museus públicos, postais ilustrados, catálogos, livros ou revistas, incluem-se cronologicamente no espaço de tempo apontado por este autor. A mera designação de Senhora da Conceição impede-nos, no entanto, de saber se se tratam de peças ocas ou fundidas. As Senhoras da Conceição fotografadas no livro Ouro Popular Português, pertencentes a colecções particulares e na quase totalidade do século passado e princípio deste, são tecnicamente fundidas, apresentando uma solução iconográfica idêntica à das peças ocas mas com um aspecto mais tosco e rude. Na Ia Exposição de Ourivesaria Artesanal de Gondomar estiveram expostas seis imagens fundidas de Na Senhora da Conceição, todas datadas de meados do século XIX e apenas uma oca, estampada, da qual não se faz qualquer referência de foro cronológico. A utilização das duas técnicas, na execução de um motivo tão popular, é por demais evidente, pormenores que as fontes documentais não esclarecem. A colecção de moldes guarda quatro exemplares de Senhoras do Caneco, em posição de verso e reverso, o que perfaz um conjunto de oito cunhos. Destinam-se, em termos técnicos, à produção de peças ocas, sendo as duas partes trabalhadas separadamente em chapa de ouro fina e soldadas nos respectivos bordos de junção. Quanto ao comprimento, variam entre três a cinco centímetros, dimensões discretas mas perfeitamente enquadradas na média corrente destas jóias que medeiam entre os dois e os vinte centímetros. O aspecto bojudo destas peças, bem como o tamanho que algumas atingem, transmitem a imagem de objectos muito pesados. Luís Chaves parece não ter escapado a esta ilusão quando escreve que algumas delas poderiam ter apreciável peso. Estes dois factores (técnica e tamanho) associados a outros de ordem religiosa e decorativa, tão ao gosto da mulher nortenha, terão sido decisivos na popularização destes motivos e, consequentemente, na intensidade e prolongamento no tempo da sua produção. Atendendo às suas características formais e decorativas, foi possível distinguir dois tipos de tratamento das Senhoras da Conceição. O primeiro é, sem dúvida, o mais representativo no contexto geral destes motivos, apresentando dois tamanhos do mesmo esquema: cerca de quatro centímetros para um, cinco para outro . Iconograficamente, Nossa Senhora, de rosto oval e sereno, aparece de pé sobre crescente reduzido e nuvem lavrada com as mãos unidas sobre o peito em sinal de oração e cabelos soltos, fartamente estendidos pelos ombros. Vestes longas cobrem-lhe o corpo, com pregueado profusamente estilizado, de composição assimétrica, onde se intercalam frisos lisos, por vezes escavados com pontos, linhas estriadas e onduladas, contínuas ou tangentes, de grande efeito decorativo. Cobre-lhe a cabeça um toucado, com sulcos verticais que acompanham nas costas o movimento dos cabelos. O crescente, quase imperceptível, separa a Virgem da nuvem que está frontalmente repleta com seis cabeças de querubins envolvidas num friso estriado e, atrás, decorada com três espirais em movimento. As folhas que sobressaem do braço esquerdo de Nossa Senhora, correspondem formalmente a alguns tipos patentes noutras peças da colecção, nomeadamente nos brincos, corações e cruzes. Ao lado desta imagem, as Senhoras do Caneco representadas nos cunhos em estudo, parecem corresponder a uma simplicação estilística, exigida certamente pelo aumento da procura, relacionada com a popularização crescente destes objectos; como o grilhão, a conceição (Senhora do Caneco) e a gramalheira. No MAPL encontra-se exposta, na Sala de Entre Douro e Minho, uma imagem de Nossa Senhora da Conceição, em ouro e de duas faces, com perto de onze centímetros e meio de altura, cujas características estilísticas se aproximam das dos cunhos em análise. E oca e opada de dupla face (barroca) representando a Virgem coroada, cabelos caídos, mãos ao peito e vestes muito pregueadas ornamentadas de flores sobre composição inferior central de quatro querubins e cinco motivos espiralados, dois na face anterior e cinco posteriores. Se a marca de ourives é ilegível, o que torna o seu autor desconhecido, a marca de constraste para ouro, usada no Porto entre 1865 a 1880, segundo informação de Laurindo da Costa, estabelece pelo menos as balizas cronológicas do seu fabrico.O MNSR e a AIORN conservam igualmente uma destas "Senhoras do Caneco", ambas de ouro e com setenta e três milímetros de altura. Tesoura A tesoura surge uma vez no grupo dos amuletos da colecção. As suas dimensões são bastante reduzidas, não chegando a atingir um centímetro e meio de altura, constituindo, assim, um dos objectos mais pequenos do conjunto. O facto de ter sido trabalhada numa pequena chapa de metal e colocada posteriormente sobre o molde de bronze sugere, novamente, que a peça em si seja mais recente do que a restante estrutura do cunho em que se insere. A tesoura está aberta, tomando a forma da cruz de Santo André, com os braços dispostos em diagonal, formando um X. A existência de uma tesoura entre os distintos modelos desta colecção revelou-se um dado muito importante para o conhecimento dos amuletos portugueses fabricados em oficinas de ourivesaria. Encontramos numerosas vezes a tesoura (enquanto objecto vulgar) ligada a várias superstições e práticas de magia e como amuleto protector contra diferentes malefícios. Leite de Vasconcelos inclui-a, por isso, no grupo dos amuletos em geral, considerando-a um amuleto ocasional. No entanto, nenhum dos autores que estudaram este tema, refere alguma vez que se fizessem reproduções com a forma de uma tesoura e que ela fosse usada como pendente ou berloque, isoladamente ou em conjunto com outros amuletos. A sua presença nesta colecção vem provar estes dois aspectos, o do fabrico e o do uso, e demonstra também o quanto as diversas superstições a ela ligada haviam sido assimiladas pelo gosto popular. O pequeno tamanho que apresenta sugere-nos que seria utilizada mais como pingente em fios, pulseiras de crianças ou adultos e correntes de relógio. Seria certamente produzida em prata e em ouro, unindo-se à forma da cruz o sentido amulético destes dois metais. Outros modelos Com uma clara predominância de adornos de orelha e em menor quantidade de pendentes, a colecção guarda ainda alguns cunhos cujas funções específicas, mas em número limitado, ou múltiplas, obrigam ao seu enquadramento em "Outros Modelos". Distinguem-se, neste conjunto, os pendentes votivos Olhos de grande popularidade em todo o país; um castão, acessório de bengala tão ao gosto da burguesia oitocentista; um broche de forma circular, decorado com uma cena de género, única em toda a colecção e, finalmente, toda uma série de cunhos que suportam modelos diversos, normalmente de reduzidas dimensões e que oferecem várias possibilidades de utilização sendo, por isso, designados genericamente de "vários".
Broche Pela forma e pelas dimensões (cerca de três centímetros de diâmetro), este cunho, único na colecção, destinava-se ao fabrico de broches e pendentes de peito; o primeiro preso à roupa por intermédio de um alfinete, o segundo suspenso em fios e trancelins através de uma argola soldada na parte superior do objecto. Em ambos os casos, a peça era estampada e reforçada atrás por um forro liso, do mesmo metal, processo que permitia a obtenção de uma jóia muito leve. O desconhecimento de jóias acabadas com estas características, juntamente com o facto desta matriz não ser utilizada actualmente na oficina, impossibilita-nos o conhecimento de outros tratamentos dados às peças, nomeadamente da aplicação ou não de esmaltes sobre a superfície do desenho. Os objectos de joalharia que mais se aproximam deste em análise, são os broches datáveis do 2º e 3º quartéis {do século XIX, em chapa de ouro cinzelada e forrada, à volta de um centro de esmalte azul, redondo, oval ou rectangular, com um diamante cravado em prata, no centro ou com uma aplicação representando um ramo de flores ou uma vista com casas ou ainda um motivo romântico. Este trabalho de chapa de ouro cinzelada (...), também se encontra em colares formados por pequenas peças ligadas por argolinhas (...). Pela descrição, infelizmente apenas textual e não acompanhada de imagem, somos tentados a entender o desenho do cunho como um motivo romântico, embora o autor não esclareça a natureza dessa designação. A ser viável esse enquadramento, o texto fornecer-nos-ia ainda informações de ordem cronológica, técnica (no uso do esmalte) e funcional, na referência apenas a broches e não a pendentes.
Em 1712 Raphael Bluteau, no seu Vocabulário Portuguez e Latino, define broche como brinco do peito, composto de três peças de qualquer pedraria, estreitas, e encadeadas ao comprido. Também se traz nas mangas. O termo broche reporta-se, neste caso, a um objecto muito concreto, fazendo parte dos diferentes tipos de jóias do peito referenciados no mesmo dicionário. Entre eles destacam-se os Santicos, nome que se dava antigamente às joyas de peito com pintura, ou esmalte, por serem aqueles que, em termos técnicos, mais se aproximam com o objecto que estamos a tratar. Note-se, no entanto, que santico é já uma designação em desuso no início do século XVIII. A descrição que de broche faz Morais da Silva em 1789, é ligeiramente diferente da anterior, sendo esta peça apresentada como uma jóia de pedraria, ou só de metal, constando de duas peças, que apertão roupas, e de ordinário no peito, à maneira de colchetes, definição mantida nas edições seguintes, acrescentando-se apenas, na oitava, o facto de poder servir também só de ornato. De modo idêntico, já o havia apresentado Francisco Solano Constâncio em 1836, quando descreve broche como jóia de duas peças de ouro, e prata, ou ornada de pedraria, de apertar ou prender roupas ou de trazer ao peito.Francisco Adolpho Coelho, em 1890, mantém a mesma ideia, mas é mais esclarecedor quando escreve que broche é lima jóia com um alfinete fixo n'ella d'um lado com que as mulheres pregam o chalé sobre o peito ou que usam como simples adorno no alto do peito dos vestidos. De forma circular, o broche apresenta uma decoração própria e única em toda a colecção. No primeiro plano e preenchendo toda a zona inferior e parte da superior do disco, destaca-se, em baixo-relevo, um barco de composição triangular composto por uma fila sucessiva de remos primorosamente ordenados pela superfície do casco, uma vela rectangular de contornos ondulantes, "8-um mastro e uma bandeira. Voltado para o lado direito, um marinheiro assim identificado pela indumentária, recolhe, com ambas as mãos, a âncora bem evidenciada no canto inferior direito do desenho; depois das Senhoras da Conceição e dum Cristo Crucificado presente num brinco comprido, este constitui uma das raras representações antropomórficas da colecção. A força do vento faz pender a vela, a bandeira e a boina da personagem para a esquerda, pormenores técnicos que ajudam a criar a imagem de um quadro quase vivo. Ligeiros cortes horizontais sobre o barco, no lado esquerdo, imitam as vagas e permitem marcar a separação entre o mar e o horizonte liso que se estende pela parte superior do cunho. Castão Castão é o remate de metal, marfim, & C. que se põe nos bastões, onde lhe pegamos, que é a extremidade superior. Esta é a definição de castão, também conhecico no tempo como gastão, descrita em 1789 na primeira edição do dicionário de Morais Silva. O nome e a função mantêm-se, na actualidade, aplicados essencialmente às bengalas, assim especificado na Lello Universal: ornato de metal, de osso ou de marfim, na parte superior de uma bengala. Bengala, pequeno bastão, em que apoiamos a mão, quando andamos, corresponde a um sinónimo do vocábulo bastão, peça de pão, cannade bengala, ou coisa semelhante, que se leva na mão para nos apoiarmos nelle, e talvez só por insignia, e distintivo militar, segundo os castões. Nesta última frase, Morais da Silva levanta a hipótese da relação da origem do termo castão com as hierarquias, nomeadamente militares, estabelecidas na sociedade do seu tempo. A definição mantém-se nas edições seguintes e ao longo de todo o século XIX. Francisco Adolpho Coelho, no dicionário publicado em 1890, prolonga a associação entre castão (ou gastão) e bastão, mas estabelece uma outra ligação etimológica do termo: castão, parte superior de uma bengala, bastão, por onde se lhe pega (...), parece ser o mesmo tema que temos em engastar, engastoar. A correlação é considerada em termos de natureza técnica e não de casta, como sugeria um século antes Morais Silva. A definição do vocábulo bastão permanece inalterável; peça de pau comprida que se pode ter na mão e serve para defesa, apoio ou insignia. A moda das bengalas encastoadas desenvolveu-se no decorrer de Oitocentos, procuradas como modelo de um estatuto económico e social prestigiado. Trata-se de um elemento constantemente referido na literatura, directamente associado com os "brasileiros" regressados e bem sucedidos; como exemplo, o cego de Landim (...); apertava na mão esquerda as luvas amarrotadas e apoiava a direita no castão de prata de uma bengala. Das centenas de cunhos existentes na colecção, apenas um incluí um modelo de castão, destinado ao fabrico de peças de prata.
O castão apresenta um relevo com altura suficiente para cobrir metade da extremidade da bengala. Tem cerca de seis centímetros de altura. A decoração do castão desenvolve-se em três etapas, rigorosamente separadas por dois anéis bojudos. A inferior representa um poliedro. A parte superior, mais pequena, é composta por um friso liso, rematado em meia esfera. A do meio concentra em si os principais motivos decorativos da peça, a saber: uma série de folhas de acanto intercaladas por esferas, formando um botão e, superiormente, por duas filas de perlados, sendo a de baixo interrompida regularmente de três em três. Pendente "olhos" Os pendentes votivos em forma de olhos consistem em pequenas placas de forma oblonga, trabalhadas em ouro, prata, cobre ou outro material. Tratam-se de ex-votos ofertados "por graça recebida", dedicados maioritariamente a Santa Luzia, advogada das doenças dos olhos, mas também a Nossa Senhora da Luz, S. Longuinhos, ou outro santo da confiança do devoto. As plaquinhas são colocadas nos altares ou aos pés das imagens das divindades escolhidas ou penduradas nas suas vestes, facto que justifica o orifício presente ao centro e na parte superior destes objectos. As peças existentes em museus públicos, referidas em artigos de revistas ou em estudos dedicados a este tema, reportam-se a duas técnicas essenciais: aos recortes em chapa ou à estampagem sobre matrizes de bronze, ferro ou aço que implicam operações de fabrico variadas e que por isso não devem ser confundidas. No primeiro caso, o motivo é desenhado e recortado numa chapa fina, fazendo-se realçar, a cinzel e buril, os contornos dos olhos com as respectivas íris, pupilas, pestanas, sobrancelhas e, por vezes, o nariz. A singeleza do peso, a simplicidade da operação e a rapidez da sua execução, contribuíram para o grande fabrico e procura destas peças. È o caso do pendente existente no MAS, talvez proveniente da Colegiada de Guimarães, em ouro e com duas pedras incrustadas representando as íris. O seu autor e local são desconhecidos, realidade que dificulta grandemente o estudo destas peças, problema que conduz, por vezes, a datações apressadas por parte de alguns estudiosos.O MSB tem exposto um ex-voto olhos em prata e de forma oblonga que se enquadra em termos técnicos neste grupo. O seu autor é também desconhecido, não apresentando este objecto qualquer tipo de marcas. Os pendentes em forma de olhos existentes na colecção reportam-se, em termos técnicos, às peças estampadas sobre matrizes de bronze. A análise formal e decorativa dos motivos inscritos nesses cunhos permitiram dentificar quatro tipos distintos de "olhos", perfeitamente enquadrados nalguns dos modelos encontrados em museus públicos. O exemplar mais simples e único, consiste numa placa oblonga e ondulada com cerca de cinco centímetros e meio de largura, representando os olhos de forma muito estilizada. O contorno dos olhos é reforçado por um perlado que envolve todo o desenho e se cruza no meio da peça, sendo a íris representada através de dois círculos relevados no centro de cada um dos segmentos amendoados. A parte inferior do centro remata em triângulo, correspondendo certamente ao arranque do nariz e a parte superior em meio círculo, possuindo um orifício escavado ao centro e destinado à suspensão do objecto. São vários os ex-votos encontrados em museus públicos portugueses com as mesmas características estilísticas. O Museu de História da Medicina "Maximiano Lemos", da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, possui em exposição um ex-voto formal e decorativamente igual ao da colecção, variando apenas no tratamento relevado da pupila, inexistente no exemplar do cunho em estudo. O Museu Etnológico Português, possui vários ex-votos em forma de olhos, sendo um deles, pela descrição feita por Luís Chaves, idêntico a este analisado: Os dois olhos estão talhados e relevados na mesma folha de lata.
Não tem divisão, tocam-se pelas comissuras internas. O ponteado da figuração das pestanas não delimita cada olho, mas sim o conjunto dos dois. Tem um apêndice minúsculo, e pode ser a indicação do nariz. Na parte superior, ao centro, há uma aselha de suspensão. Entre a grande profusão de olhos existentes no Museu da Sé de Braga, encontram-se em exposição duas peças que podem ser incluídas neste grupo: um dos dois, em ouro, é exactamente igual ao do cunho da colecção, com o mesmo friso perlado, a mesma representação da íris e a estilização triangular do nariz.
O seu autor é, também, desconhecido. O outro, em prata, apresenta igualmente um perlado (estilização plena das pestanas ou sobrancelhas) a toda a volta do conjunto contendo, no entanto, um tratamento distinto dos olhos propriamente ditos. Apresenta duas marcas, uma de ourives, não identificada, a outra de contraste, marca de garantia aproximada da prata do toque de 0,833 usada na contrastaria de Gondomar de 1913 a 1938. O Museu Alberto Sampaio e o Museu Etnográfico Português possuem um exemplar destes pendentes com o mesmo tratamento técnico e decorativo dos descritos atrás mas que representam apenas um olho: o primeiro, de ouro, proveio da Colegiada de Nossa Senhora de Guimarães e o segundo, em lata, foi oferecido a uma imagem de Santa Luzia não especificando, no entanto, Luís Chaves, a sua origem. Ambos apresentam a mesma banda perlada em toda a volta do olho, sendo a íris e a pupila do primeiro esmaltadas a azul. O segundo tipo apresenta um desenho mais cuidado dos olhos, de contornos amendoados, com a rigorosa separação das pálpebras, esclerótica, íris e pupilas através de linhas contínuas e ponto escavados para o último elemento.
O conjunto é envolvido a toda a volta por um friso estriado, estilização provável das pestanas, possuindo superior e inferiormente e ao centro uma flor com seis pétalas. Na parte superior e no meio de uma das pétalas do motivo floral, o cunho apresenta um ponto escavado destinado ao orifício de suspensão. Existem duas matrizes iguais mas de tamanhos diferentes na colecção: a maior com cerca de cinco centímetros e meio de largura e a mais pequena com quatro centímetros. O terceiro tipo representa o mesmo tratamento dos olhos dos dois cunhos anteriores, diferindo destes apenas na maior profusão de motivos ornamentais que circundam os órgãos. Mantêm-se as mesmas rosetas do centro de seis pétalas, prolongadas num friso contínuo de motivos fitomórficos de gosto barroquizante, com destaque para os elementos florais afectos a rosas, inscritos nas extremidades esquerda e direita da peça. Tal como nos exemplares anteriores, existem também dois cunhos com estas características um com seis centímetros de largura, o outro com quatro, ambos possuindo na parte superior e ao centro um pequeno ponto escavado, destinado à colocação da argola de suspensão. O Museu de História da Medicina do Porto possui um cunho igual a estes, embora tal como no exemplar anterior existente no mesmo museu, não nos tenha sido possível obter qualquer informação a seu respeito. O Museu da Sé de Braga expõe, também, dois destes pendentes de prata. Um deles apresenta duas marcas muito pequenas, a do ourives não identificada e a de contraste relativa ao Porto, não se especificando mais nada a seu respeito no Inventário de Ourivesaria deste Museu. O último tipo difere completamente destes últimos analisados. O contorno dos olhos, totalmente estilizados, obedece a dois segmentos de arcos ogivados, deitados, sendo decorados exteriormente, superior e inferiormente, por dois motivos concheados, ao centro, ladeados por um perlado constituído por três meias esferas. O interior é escavado e, apesar de não conhecermos nenhum exemplar acabado com estas características, somos levados a crer que seria recoberto com esmalte ou pedraria. De todos os museus públicos conhecidos, o Tesouro da Sé de Braga é aquele que guarda a maior colecção de ex-votos em forma de olhos, com características tipológicas bastante diversas nas quais se incluem, como vimos, os presentes na colecção. Através desse conjunto de pendentes, foi-nos possível conhecer o nome de dois ourives e respectivas oficinas que trabalharam estas peças. O primeiro respeita a António Moura Fernandes de Sousa, ourives do Porto com marca registada em 1960 e o segundo refere-se a José Ferreira das Neves Júnior, ourives de Gondomar com marca registada em 1941, transferida para José Ferreira das Neves Júnior & Irmão em 1946 e para José Ferreira Neves Júnior em 1955.
Tratam-se ambos de ourives a trabalhar neste século, o primeiro num tempo relativamente próximo. Em termos formais, reportam-se estes pendentes marcados a placas oblongas, de forma idêntica às analisadas, tecnicamente estampadas apresentando, no entanto, motivos decorativos diversos. Fonte: SOUSA, Ana-Uma Técnica Milenar numa Oficina de Gondomar, in Ourivesaria Estampada e Lavrada. vol.I, Porto,1997, pp. 110-150. Avalie já as suas jóias, fale conosco! Conheça como se compra e transmite Cautelas de Penhor. Saiba também quais são os nossos critérios de avaliação! Conheça as peças com mais valor! New Greenfil Lda, faça parte de uma história de sucesso! |